Tania Prado
Apesar de todo o esforço empreendido, policiais e servidores da PF estão recebendo diagnóstico positivo de COVID-19
Em meio à crise instalada pela contaminação do vírus COVID-19, a Polícia Federal (PF) tem um efetivo composto por cerca de 10.500 policiais, que exercem atividade típica de Estado, de risco, em todo o território nacional e nas adidâncias e oficialatos no exterior, e estão diretamente exposto à pandemia.
Apesar de todo o esforço empreendido, policiais e servidores da PF, expostos ao vírus, estão recebendo diagnóstico positivo de COVID-19 e lutando pela vida. Além destes, há uma parte do efetivo apresentando sintomas, em quarentena, e outros no grupo de risco, em isolamento social, portadores de doenças crônicas, maiores de 60 anos, gestantes e lactantes, nos últimos 15 dias.
O art. 3º, III, do Decreto Federal nº 10.282 de 20 de março de 2020, qualificou a atividade de segurança pública como de caráter essencial e imprescindível ao enfrentamento da pandemia do coronavírus no Brasil.
Diante de tudo isso, mais do que um desafio, é dever do Estado oferecer a esses profissionais as condições de trabalho adequadas para cumprimento de sua missão. Tão logo a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou a condição de pandemia, a administração pública federal passou a editar normas com mudanças nas rotinas do serviço público (Instruções Normativas nº 19 e nº 21 da Secretaria Nacional de Gestão e Desempenho de Pessoal, da Secretaria Especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia).
A Polícia Federal também suspendeu a matrícula e a realização da segunda turma do Curso de Formação Profissional da Academia Nacional de Polícia, etapa final do concurso público para provimento de cargos de Delegado, Perito, Agente, Escrivão e Papiloscopista diante dos riscos de contaminação por aglomeração de grande número de alunos, adiando a recomposição de parte do efetivo da PF.
Ainda no âmbito da Polícia Federal, foram editadas pelos gestores diversas normas para enfrentamento da emergência de saúde pública. O atendimento ao público, tanto nas áreas de emissão de passaportes e de regularização migratória de estrangeiros, de controle de produtos químicos, de armas de fogo e de segurança privada, como em polícia judiciária, passou a ser progressivamente restringido nas unidades da PF para casos urgentes, sobretudo naquelas que se encontram nas regiões com maior incidência de contágio pelo vírus, como São Paulo e Rio de Janeiro.
As entidades de classe, demandadas por seus filiados, pleitearam aceleração de providências para fornecimento de materiais de proteção e restrição de acesso ao público. A propósito, tempo é uma peça fundamental para sucesso na preservação da vida e da saúde no contexto de uma pandemia.
Restou estabelecido na PF que se evite a movimentação, o deslocamento e o agrupamento de efetivo. Às equipes de coordenação de operações policiais compete adotar medidas para a proteção de equipes envolvidas na execução de mandados e de diligências.
Quanto às investigações, no curso dos inquéritos policiais, as oitivas podem ser realizadas a distância, por videoconferência. O e-Pol, Inquérito Policial eletrônico, garante o fluxo célere deste ao Ministério Público e ao Judiciário, sem deslocamento dos autos e de pessoal, porém demanda urgente aperfeiçoamento das redes de fluxo de dados.
Já o atendimento nos postos de controle migratório, portuários, aeroportuários e de fronteiras foi mantido, em conformidade com a política do governo federal de admissão de viajantes (restrição excepcional e temporária da entrada no país de estrangeiros).
Os servidores que tenham contato com o público devem utilizar equipamentos de proteção individual (EPIs), fornecidos pela PF, e adotar as demais medidas preventivas de higienização e cuidados. Tais equipamentos estão chegando aos poucos nas unidades da PF, enfrentando as mais diversas dificuldades logísticas.
Na semana passada, recursos recuperados pela Polícia Federal no combate à criminalidade organizada foram destinados à área da saúde pública e ao enfrentamento da pandemia do COVID-19, o que demonstra que investir na instituição é algo que dá um retorno muito grande à sociedade.
Enquanto surgem inconstitucionais projetos de lei e propostas de emenda à Constituição com ameaça de injusto e inaceitável corte salarial, todo o efetivo policial, em razão da pandemia, passou acumular suas atividades cotidianas com o trabalho em regime de sobreaviso permanente para o atendimento de contingências relacionadas ao estado de emergência de saúde pública, para qualquer missão, a qualquer hora do dia, em qualquer dia da semana, com todos os graves riscos inerentes a tal mister.
Convém salientar que o sobreaviso não é remunerado e que a saúde dos familiares dos policiais e dos demais servidores reflexamente está mais exposta aos riscos da pandemia que outros trabalhadores. O servidor que quiser contar com plano de saúde, atendimento, apoio psicológico e hospitalização, deverá pagar às suas próprias custas. O Estado está deixando estes agentes públicos desamparados e à sua própria sorte.
É importante lembrar que, em outubro do ano passado, a Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF) encaminhou ofício à Direção-Geral da PF* com pedido de gestão junto às instâncias governamentais para o fornecimento de plano de saúde para os policiais, indenização para o sobreaviso, atualização do valor das diárias para missões policiais, planejamento de concursos públicos para recomposição e ampliação do efetivo dos cargos policiais e administrativos, adoção de critérios mínimos objetivos para nomeação de chefias, adidâncias e diretorias, correção do tratamento dado a algumas cidades de difícil provimento quanto ao adicional de fronteira. Contudo, até agora, foi atendido apenas o pedido de melhoria da gratificação de chefias de delegacias descentralizadas, com a edição da medida provisória 918/2020, que remanejou as funções de confiança.
Há poucos dias, com apoio da PF, as entidades de classe de todas as categorias, policiais e administrativas, formaram uma rede de solidariedade “um por todos e todos por um”, para reforçar as medidas de enfrentamento à pandemia junto a policiais federais, servidores administrativos e colaboradores, ativos e aposentados, além de familiares.
A abertura deste canal de comunicação entre PF e entidades traz um precedente importante para análise e acolhimento urgente das providências requeridas no ofício da ADPF para atenção do efetivo, exposto aos graves riscos inerentes à profissão. É preciso ir além, avançar muito mais na gestão do pessoal da PF e na garantia dos seus direitos.
Artigo publicado na Edição 31 (de 31/03 a 06/04/2020) do Jornal eletrônico Fonte Segura, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública
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Tania Prado, Mestre em Segurança Pública pela Universidade Jean Moulin Lyon 3, na França. Diretora Regional da Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal de São Paulo (ADPF-SP) e Presidente da Federação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (FENADEPOL) e do Sindicato dos Delegados de Polícia Federal do Estado de São Paulo (SINDPF SP).
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